O bloco volta à
rua
O LP Sinceramente, de Sérgio Sampaio, lançado de
forma independente em 1973, está de volta à praça. Se por acaso você, leitor,
acha que nunca ouviu falar de Sérgio Sampaio, tente cantarolar este refrão: “Eu
quero é botar meu bloco na rua/ Brincar, botar pra gemer/ Eu quero é botar meu
bloco na rua/ Gingar, pra dar e vender”. Lembrou? Pois é... Sérgio Sampaio
arrasou nesse baita sucesso.
Logo após o estouro nas vendas do compacto que continha “Eu
Quero É Botar Meu Bloco na Rua”, apresentada no VII Festival Internacional da
Canção da TV Globo (1972), e não conseguindo igual êxito comercial nos três LPs
que vieram a seguir, Sampaio foi tachado pela indústria fonográfica de “artista
difícil” e pela mídia de “autor maldito”.
Seu primeiro LP (1973) tem como título o mega hit Eu
quero é botar meu bloco na rua. Em 1976 veio o segundo: Tem que
acontecer. E, relançado agora em CD, Sinceramente (1982)
foi seu terceiro e último long play solo. Com onze músicas
suas, sendo uma (“Cabra Cega”) em parceria com Sérgio Natureza, Sampaio abriu o
peito e demonstrou o quanto sua alma estava dilacerada. Os tempos andavam
bicudos...
Contando com a participação talentosa de Renato Piau
(pianista e parceiro de Sérgio Sampaio desde sempre), Zezinho Moura (piano
elétrico), Ricardo Feijão (baixo), Charles Chalegre (bateria), Oberdam
Magalhães (sax e flauta), Luciano (arp strings), Serginho Boré (percussão) e
com o violão acústico de Sérgio Sampaio, Sinceramente (Saravá
Discos) se revela um CD bem remasterizado, cujo som tem brilho e profundidade.
Além de samba, boleros e canções, o álbum tem baladas que
despretensiosamente namoram o brega, sem, contudo, permitir que se lhes
pespeguem tal adjetivo. Pois elas lembram, na verdade, a pujança transformadora
das baladas que Raulzito tão bem difundiu e Sérgio adotou.
“Essa Tal de Mentira” é uma canção na qual a boa voz de
Sampaio é embalada pelo som dos violões (um improvisa, enquanto o outro
harmoniza) e do baixo. Os versos ecoam seus sentimentos: “Com a alma partida/
Dando com o corpo nas grades da cela da vida/ Como num mar de paixão/ Náufrago
que estende a mão/ Agarro o meu violão/ E canto uma canção”.
Luiz Melodia divide o canto com Sérgio no samba “Doce
Melodia”, homenagem de Sampaio a Luiz Melodia. Divertidos e cheios de ginga, os
dois se esbaldam e esbanjam malandragem.
O violão começa “Nem Assim”. A voz de Sérgio vem firme,
entoando as dores da separação, mas tudo com muito bom humor.
Em “Sinceramente”, a música que dá título ao disco, os violões
acompanham a voz que vai aos agudos para cantar notas da melodia. Os versos são
um louvor à independência, no sentido mais amplo do termo: “Não há nada mais
tranquilo/ Do que ser o que se sente/ E poder amar, perder, chorar/ Depois
ganhar/ Assim sinceramente”.
Vítima de pancreatite, Sérgio Sampaio nos deixou em 15 de
maio de 1994. Mais um dos grandes compositores que a música brasileira perdeu
para o alcoolismo. Pena.
Aquiles Rique
Reis, músico e vocalista do MPB4
Nenhum comentário:
Postar um comentário