O poder de uma
cantora
Depois de lançar dois discos, a
cantora e compositora mineira Patrícia Ahmaral volta à cena comSuperpoder (gravado
por meio da Lei Estadual de Incentivo à Cultura de Minas Gerais, com o
patrocínio da Vivo).
Produzido pelo contrabaixista
Fernando Nunes, também arranjador das treze músicas do álbum (em duas delas
dividindo o trabalho com outros três arranjadores), contando com participações
especiais de Lucinha Turnbull (em “Trilha de Luz”, da própria Lucinha) e de
Chico César (em “Sorry, Baby”, uma das três músicas de Patrícia presentes no
disco), tendo no repertório desde Alceu Valença, Lula Queiroga (autor da
faixa-título) e Belchior até Zeca Baleiro, Caetano Veloso e Torquato Neto,
passando por Totonho, Vander Lee (presente com duas músicas – uma delas,
“Revoada”, em parceria com Ahmaral), Paulo César Barros, Getúlio Cortes, Carlos
Tê e Hélder Gonçalves, Superpoder justifica o título: Patrícia
é poderosa.
Seu poder maior advém da força do
seu cantar. Levando as interpretações às últimas conseqüências, sem medo de se
fazer intensa ou demasiada, as palavras lhe saem como petardos que miram o
entusiasmo do ouvinte, trazendo-o pelo ouvido para a roda de fogo. A chama de
seu canto acende o prazer de vê-la afinada, sem deslizes que pudessem
comprometer o seu desempenho.
Sua poética é forte, como mostram
os versos da sua “Do Querer” e de “Sorry, Baby”, uma parceria com Chico César –
que com ela divide o canto: Pelas mazelas/ Pelo medo/ Pelo soco na
cara/ Pelo tapa na veia/ A navalha/ Pela noite escura/ Pela bala/ Pela infância
bandida/ Pela fumaça (...)
Os arranjos, tanto de uma quanto
da outra, têm zabumba, triângulo, coquinho, caxixi, block, pandeiro árabe e
ganzá nas mãos de Bruno Santos. Têm ainda, a bateria de Luís Patrício e o
pandeiro e a cuíca de Guilherme Kastrup, tudo ajuntado ao acordeon (Tatá
Sympa), ao violão de náilon (Fernando Nunes), ao violino (Júnior Gaiatto), ao
violão e ao banjo (Tuco Marcondes). A mistura confere à pisada riqueza surgida
no calor e na fortaleza da cultura musical do Nordeste, com tempero das Gerais,
coisa que o ouvinte num instantinho sacará, ainda que jamais tenha posto os pés
naquelas terras nem os seus ouvidos nunca tenham sentido a sua plenitude.
Para melhor avaliar uma cantora a
quem nunca ouvimos antes, nada melhor do que ver como ela se sai numa música
cuja gravação marcou época. E Patrícia Ahmaral brilha em “Mamãe Coragem”
(Caetano e Torquato), com direito à citação de outra canção deles, “Deus Vos
Salve Esta Casa Santa” e à levada pop de rico poder de arrebatamento... Caetano
adorará ouvir.
Com arranjo calcado em guitarras,
violões e bateria, tendo o baixo a segurar as pontas e os teclados soando
detalhes precisos, “De Romance” (Zeca Baleiro) realça a modernidade do cantar
de Patrícia, quando a fortaleza volta a dar as caras e vigora a cantora
poderosa que salta no escuro sem rede de proteção, voando pelo mundo que abre
os braços e a acolhe.
Aquiles Rique Reis, músico e
vocalista do MPB4
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